quarta-feira, julho 02, 2003

Ser tocado pela profundidade da obra é um sentir que desvanece.

A propósito da evocação de Walter Benjamin no Socio[B]logue (aconselho vivamente a leitura do post), algumas considerações au tour dos contributos do filósofo para uma quase sociologia da comunicação e da recepção estética...

Benjamin compreende a reprodutibilidade técnica como ameaça ao processo de constituição da obra de arte (dilui-se o lugar da mão) e, sobretudo, às instâncias incorporais do génio criativo, do culto esteticista. Alteram-se condições e lugares de produção e recepção. Um novo estatuto está por reivindicar: pintura, literatura, teatro precisam de se reinventar como gesto e assim procurar formas de infusão com o mundo, caminhos de [re]investimento social.

A grande questão é a perda da aura, da [feliz] possibilidade de contemplar ou criar alguma coisa, preservando-a de uma difusão massificante...

A aura é uma relação espiritualizada com a obra de arte, convite à viagem interior do sujeito que contempla. Permanece no choque e no confronto in loco, in tempus. Esfuma-se na mediação técnica, porquanto se perde uma emoção maior, um não-sei-quê que faz a nossa interpretação pessoal e ilimitada.

A exposição da obra de arte [e consequente imposição de uma mediação forçada] cobre-a de superficialidade e de banalização. A reprodutibilidade técnica pode até gerar aproximação: mas não deixa de ser a obra a passar por nós, em vez do contrário.

Morre o aqui e agora. Morre o valor de culto. O social passa a ditar o gosto. Ignora-se que entender a obra implica que nos integremos e entreguemos a ela...


Ler: Benjamin, Walter: "A Obra de Arte na Era da sua Reprodutibilidade Técnica", in Sobre Arte, Técnica, Linguagem e Política, Relógio d'Água, 1992