quinta-feira, agosto 28, 2003

Pauis

A complexidade pode definir-se semioticamente. Como uma lógica de produção de comunicação que articula a apropriação das formas simbólicas. Como uma dinâmica orgânica.

«Pauis de roçarem ânsias pela minh'alma em ouro...
Dobre longínquo de Outros Sinos... Empalidece o louro
Trigo na cinza do poente... Corre um frio carnal por minh'alma...
Tão sempre a mesma, a Hora!... Balouçar de cimos de palma!...
Silêncio que as folhas fitam em nós... Outono delgado
Dum canto de vaga ave... Azul esquecido em estagnado...
Oh que mudo grito de ânsia põe garras na Hora!
Que pasmo de mim anseia por outra coisa que o que chora!
Estendo as mãos para além, mas ao estendê-las já vejo
Que não é aquilo que quero aquilo que desejo...
Címbalos de Imperfeição... Ó tão antiguidade
A hora expulsa de si-Tempo! Onda de recuo que invade
O meu abandonar-me a mim próprio até desfalecer,
E recordar tanto o Eu presente que me sinto esquecer!...
Fluido de auréola, transparente de Foi, oco de ter-se...
O Mistério sabe-me a eu ser outro... Luar sobre o não conter-se...
A sentinela é hirta - a lança que finca no chão
É mais alta do que ela... Para que é tudo isto... Dia chão...
Trepadeiras de despropósito lambendo de Hora os Aléns...
Horizontes fechando os olhos ao espaço em que são elos de erro...
Fanfarras de ópios de silêncios futuros... Longes trens...
Portões vistos longe... através de árvores... tão de ferro!»

[Fernando Pessoa]


domingo, agosto 24, 2003

Da função do espaço



Uma construção é um artefacto. E por isso é também um signo. A sua função é equivalente ao sentido. Porque a construção é também uma topologia que demarca o público, o social, o íntimo, o recolhimento.

sexta-feira, agosto 22, 2003

Isotopia



Da taxonomia das estratégias interpretativas. É uma permanência: dos traços textuais. É, no domínio da teoria da informação, uma redundância que assegura a coerência. Mas mais do que uma, os textos oferecem-nos múltiplas isotopias. E ainda bem: delas brotam leituras coerentes diferentes.

terça-feira, agosto 19, 2003

Azul



A metáfora é uma transferência de sentido: substancial e esquemática; de um domínio ao outro. E os graus de [in]concretude explicam a noção do abstracto.

[Joan Miró, Bleu II]

Atentado

As doutrinas da combatividade anti-coligação certamente suscitam efervescências afectivas e intelectuais. Querendo manter-me equidistante, não posso deixar de acreditar que, para o homem árabe, a perda da soberania e o acantonamento da sua cultura criem traumas. Mas não há corpos de ideias, nem especulações metafísicas que serenem o que advém da acção criminosa. Não há justificação: e nisso só os iraquianos perdem. Hoje, mais um declive. O atentado é sobretudo contra os axiomas da construção da comunidade mundial. E o pior estará para vir.

Em breve a guerra tornar-se-á mais ofensiva e generalizada. Mais técnica, ela parece apontar um modo estratégico operacional: assusta-me que se torne total e popular.

domingo, agosto 10, 2003

O gosto dos outros

Só hoje vi o filme.

Há uma face da encarnação simultânea de um mesmo dado. Obscuro e profundo, é apaixonante decifrá-lo.

As duas atitudes pareciam não ter nada em comum. Ambas negavam a concepção adquirida que o outro tinha das formas belas.

Mas a obra e o gosto descobrem-se na poeticidade das formas e do informe, na plasticidade frenética.

E ele descobriu como construir e ler obras abertas e em movimento.

Desrazão



E se não houvesse totalidade? Nem modelos de integração e coesão? Nem palavras de decência? Hoje observo o interdito e a desrazão.

Porque a loucura é diferente, é subversiva, é anti-ordem, tem necessariamente de mergulhar num anti-mundo. [Michel Foucault, História da Loucura]

[Van Gogh, Chair]

A blogosfera constitui cultura?



Creio que a comunidade constitui factor cultural.

A origem capilar da blogosfera só faz sentido quando acolhida na expansão junto dos outros. Aqui, neste virtual binário, onde cada sugestão, cada interpretação nova e original se destina a ser apropriada [bem ou mal] pela colectividade, constituindo património comum.

[Van Gogh, The Olive Trees]

Do Blog



Blogar é partir da vida, mergulhar na vida e explorar a vida individual. É uma dialéctica sob uma perspectiva ontogenética (enquanto evolução cognitiva do sujeito).

[Van Gogh, The Mulberry Tree]

sábado, agosto 02, 2003

As imagens do corpo



As imagens são capazes de reorganizar e reinterpretar as formas do corpo.

Elas dão-nos a ilusão de o perceber.

Relaciona-se o todo com as partes. Pensa-se a constituição.

Relaciona-se a dominação. Ou uma gramática da dependência.

[Les Demoiselles d'Avignon, 1907
Pablo Picasso]

Do gesto



O gesto é um signo. Envolve uma expressão. Uma expressão diferenciável do conteúdo.

A expressão envolve uma postura, um movimento.

O conteúdo é o tudo contido num estado de espírito. É um ser.

[Minotaure, 1928
Pablo Picasso]