quarta-feira, novembro 12, 2003

Das bibliotecas



A razão de um discurso que faça a apologia das bibliotecas é sociológica, é comunicativa, é argumentativa. A experiência da vida insere-se na relação do homem com o mundo, com os outros e consigo próprio – e isto só é possível nas manifestações simbólicas da cultura, nos enigmas do mundo que, num movimento hermenêutico, procuramos conhecer. As bibliotecas acrescentam-nos em dimensão interlocutiva, em campos de produção de sentido, nos domínios da comunicabilidade. E não nos esgotamos, antes nos potenciamos e projectamos na polifonia que velhos e novos media por elas disponibilizados manifestam e empregam ao conhecimento.

Os traços que enquadram a experiência dos indivíduos encontram na metáfora da multifuncionalidade um paradigma e na experiência multimodal e multimediática uma concretização. A biblioteca assume a forma de significante incontornável se pensarmos nas tecnologias da informação e nas literacias exigidas para a apreensão da mudança, sobretudo quando os conteúdos informativos são fluídos e vão exigindo sujeitos substancialmente adaptativos.

sábado, novembro 08, 2003

Da hermenêutica de Dilthey



Das ciências do espírito, Dilthey diz-nos:

- têm por objecto textos, expressões verbais, acções que se investigam pela compreensão das experiências e intenções autorais. Requerem uma metodologia interpretativa hermenêutica que lida com maior inteligibilidade com aqueles objectos, reconstruindo os processos cognitivos internos que motivaram e deram sentido a cada um deles.

- a compreensão (verstehen) deve surgir como método para estudar o humano (que tem história, racionalidade, linguagem próprias e que só pode ser analisado no quadro da experiência), por oposição à explicação (erkennen), gerada pelo método hipotético-dedutivo das Ciências da Natureza (centrado nos comportamentos exteriormente observáveis e na construção de leis causais).

sexta-feira, novembro 07, 2003

Dos pseudo-eventos

Na sociedade pós-moderna há muito de relativo e de ilusório. Há falsas ideologias e falsos ideais. Há uma sede constante de libertar os instintos reprimidos e deixar-se levar pela sensibilidade, o que contribui para uma visão imediatista do homem. Anunciam-se os propósitos subjectivos do homem que deseja experimentar fortes sentimentos de prazer, uma visão que se alia a uma gnose libertadora do corpo e do espírito, em comunhão com uma energia cósmica absoluta, globalizante, que a todos irmana.

Impera a ideia de que os instintos do homem devem ser soltos e satisfeitos, deve-se viver o momento, remetendo para segundo plano a racionalidade (que parece desnecessária, secundária e limitadora).

Também a televisão e os média se revestem desta perspectiva, procurando causar uma superexcitação da sensibilidade, apagando a vontade e a inteligência. O indivíduo permanece passivo diante das cenas que se sucedem, alheado de qualquer capacidade intelectiva, recebendo um universo de sensações desordenadas e imagens ready-made.

Repetem-se clichés pré-fabricados potenciadores de uma ilusão de conhecimento, fecha-se e reduz-se a percepção do mundo, confina-se o indivíduo ao prazer infantil do jogo, de uma realidade virtual muito mais agradável. Lembro, a propósito, Daniel Boorstin e o seu livro The Image: or what happened to the American Dream. O homem pós-moderno confronta-se, cada vez mais, com pseudo-eventos espectaculares, não percebendo que, exposto a sucessivas ilusões vai, aos poucos, envenenando a experiência do mundo. O homem pós-moderno é submetido a forças invisíveis que fabricam ilusões e a vida pública torna-se palco de um qualquer espectáculo. Os pseudo-eventos aumentam a ilusão que temos do mundo, aquilo a que muitos chamam a ilusão americana de omnipotência. (...) Uma vez provado o charme do pseudo-evento somos tentados a acreditar que ele é o único acontecimento possível.